Em um país chamado Viridia, houve a supressão dos direitos femininos. Uma mulher não pode fazer nada, que não seja servir o homem. Não lhe é permitido, sequer, aprender a ler, ou mesmo segurar um livro. Nesse regime totalitário, o governante e seu filho primogênito podem escolher três jovens, a cada três anos, para serem suas graças, isto é, mulheres que ficam ao dispor para qualquer serventia. Serina foi educada a vida toda para ser uma graça, enquanto sua irmã mais nova, Nomi, foi educada para ser uma aia, a serviçal de uma graça. Mas uma ação impensada de Nomi muda tudo: ela é escolhida como graça, enquanto Serina é presa e enviada para uma ilha isolada, de onde ninguém sai vivo.

Se você for um leitor de distopias e/fantasia, irá encontrar várias semelhanças entre GRAÇA E FÚRIA com outros livros do mesmo gênero, como BATTLE HOYALE, JOGOS VORAZES, A ESCOLA DO BEM E DO MAL, A RAINHA VERMELHA, A SELEÇÃO, TRONO DE VIDRO, entre outros. Isso poderia ser algo negativo, mas a autora soube aproveitar os pontos essenciais de cada um desses livros e transformá-los eu seu próprio produto. E o qual seria o resultado dessa mistura toda? Uma história que exalta o empoderamento feminino, de uma forma que transmite para seu público alvo, jovens na fase da adolescência, uma mensagem claríssima, objetiva, direta. Um público que precisa exatamente disso, uma vez que tem o interesse dispersado facilmente.

A autora desvia sua narrativa de um tom político e feminista, como existe, por exemplo, em O CONTO DA AIA, e leva para o lado de empoderamento feminino, para uma aventura simples, cheia de vigor, com uma linguagem simples e jovem. Para quem acha que é a mesma coisa, se engana: de forma bem simples, feminismo é uma ideologia de igualdade entre os gêneros; enquanto empoderamento, também de forma bem simples, são ações coletivas que fortalecem um gênero. Empoderamento é uma consequência do movimento feminista, mas, nem por isso, é a mesma coisa.

Não é uma escolha quando você não tem liberdade de dizer não. Um sim não tem nenhum valor quando é a única resposta que se pode dar!

Quando digo que GRAÇA E FÚRIA trata de empoderamento, é porque as duas personagens principais, que narram a aventura em capítulos alternados, tomam para si o poder de fazer algo para mudar a situação em que se encontram, e, ao mesmo tempo, iniciam um movimento de força feminina que abre caminho para a retomada dos direitos da mulher. E por poder, me refiro literalmente ao poder físico. Em um local onde apenas a força impera, é necessário suplantar essa força para se tornar livre.

É muito gratificante acompanhar a evolução de Serina, que deixa de ser uma garota mimada e cheia de caprichos, para uma guerreira dotada da fúria, uma vez que só assim, ela conseguiria se manter viva na ilha em que está encarcerada. Ao mesmo tempo, acompanhamos a perda da inocência de Nomi, que, depois de ser enganada pela esperança de liberdade, aprende que não se pode confiar em algumas pessoas, que o inimigo pode assumir a pele de cordeiro e que ela precisará crescer e ser forte se quiser se salvar e salvar a irmã.

Essa evolução das personagens é uma grata surpresa e transmite uma mensagem muito importante sobre o quanto uma mulher pode ser forte. Ainda mais hoje em dia, quando livros de autoras famosas, fazem exatamente o contrário e transformam a mulher em um objeto a ser usado pelo homem.

Certas partes do livro são empolgantes pelo que transmitem ao leitor. Resolvi fazer uma pequena lista de dez motivos para você não ter qualquer dúvida sobre a leitura:

UM: No início, o tom do livro é bastante juvenil, até ingênuo. Mas aí acontece algo e Serina é presa e condenada a viver em uma ilha afastada, onde as mulheres são controladas por homens e precisam duelar entre si para conseguirem alimento. Isso dá um certo choque e tira todo o tom leve que havia antes.

DOIS: Em certa parte do livro, Serina conta à irmã uma história sobre dois pássaros que precisam atravessar o oceano, mas voando sozinhos, eles sabem que não conseguirão. Então, eles revezam o voo, um carregando o outro, alternadamente, para descansarem. A história é bonita e emblemática para a época em que nós vivemos, onde o que prevalece é o individualismo.

TRÊS: Malachi e Asa, o herdeiro e seu irmão mais novo, respectivamente, embora não tragam nenhuma surpresa, funcionam para aquilo que foram criados pela autora: confundir o julgamento de Nomi. Entretanto, há uma surpresa, que não é a verdadeira intensão de um deles, mas, sim, a crueldade que ele perpetua, quebrando de vez o clima ameno da história.

QUATRO: Monte Ruína, a ilha de pedra e lava para onde Serian é levada, traz toda a frieza espelhada do regime totalitário. Não existem cores, não existe calor, não existe vida em toda a ilha, com exceção das mulheres e dos guardas. É o local perfeito para o drama que se segue.

CINCO: As personagens secundárias da ilha são todas interessantes: Jagana, Maris e Oráculo, principalmente, possuem histórias trágicas e comoventes. Não foram criadas apenas como enfeite e possuem, cada uma em um nível, grande importância no desenvolvimento da força de Serina.

SEIS: Apesar do destaque serem as mulheres, os homens estão representados por um dos príncipes, e não vou dizer aqui qual, e por Valentino, um dos guardas da ilha prisão. Valentino é justo e tenta, dentro do possível, ajudar as prisioneiras diante da crueldade dos colegas. Sua história é a mais trágica de todas e enaltece sua importância dentro dos acontecimentos do clímax do livro.

SETE: Não existe enrolação na história. Cada capítulo trata de algo e tudo acontece em ritmo acelerado. Enquanto Nomi é levada para dentro de uma insurreição no palácio dos regentes, Serina cria a sua própria.

OITO: O livro é uma série, então não espere a conclusão da história neste volume. E, sim, isso é uma qualidade, porque existe muito para ser contado sobre as duas irmãs, e a forma como este volume termina, deixa você pulando na cadeira de ansiedade.

NOVE: Embora aconteça uma boa quantidade de violência e mortes, nada é desmedido, gratuito ou descrito de maneira que possa incomodar o jovem leitor. Então, é um livro para todas as idades, que ensina e explica o motivo de todos sermos iguais, sem distinção de gênero, raça, cor ou credo.

DEZ: Leia o item de nove de novo, porque ele, sozinho, é suficiente para justificar a leitura de GRAÇA & FÚRIA sem qualquer dúvida.


AVALIAÇÃO:


AUTORA: Tracy BANGHART cresceu na zona rural de Maryland, nos Estados Unidos. É formada em inglês pelo Davidson College, na Carolina do Norte, e pós-graduada em editoração pela Universidade Oxford Brookes, na Inglaterra. Atualmente, Tracy se dedica totalmente à escrita e viaja o mundo com o marido, o filho e seus animais de estimação.
TRADUÇÃO: Isadora PROSPERO
EDITORA: Seguinte
PUBLICAÇÃO: 2018
PÁGINAS: 298


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