Após escrever POR QUEM OS SINOS DOBRAM, em 1940, um dos livros mais famosos de sempre, Ernest Hemingway passou por dez anos de ostracismo e irrelevância literária, lançando apenas um livro nesse período, que não foi bem aceito pela crítica e nem foi um sucesso de vendas. Após o término da Segunda Guerra Mundial, ele se mudou para Havana, capital de Cuba, cidade pela qual era apaixonado, e se dedicou a outras atividades, como a pescaria. Devido a esse enorme hiato, muitos críticos consideravam que ele não escreveria mais nenhum livro, que sua carreira como escritor estava terminada. Mas, em 1952, Hemingway enviou o manuscrito de O VELHO E O MAR para seu editor, com um pequeno bilhete anexado, onde estava escrito: “Eu sei que isso é o melhor que posso escrever na minha vida toda”. E foi. O livro ganhou o Pulitzer em 1953, e Hemingway ganhou o Prêmio Nobel de Literatura no ano seguinte, em 1954.

Antes de continuar, uma aviso: não tem como falar sobre O VELHO E O MAR sem mencionar alguns spoilers. Isso porque algumas partes são fundamentais para compreender a vida de Hemingway e para compreender o real significado do personagem do livro. Entretanto, você ter conhecimento dessas partes da história, não estragará nenhuma surpresa, porque não se trata de uma obra de suspense, ou de reviravoltas, mas de profunda indagação sobre o que somos. Então, leia a resenha e depois leia a obra, se ainda não leu, porque vale muito a pena, e fará você se questionar sobre como você vive.

A história segue a maré de azar de um velho pescador, Santiago, que está há quase três meses sem conseguir pegar um único peixe. Seu ânimo é mantido apenas pelo jovem aprendiz de pescador, Manolin, que acredita que esse período de má sorte irá acabar em breve. Na última saída antes de resolver desistir, Santiago finalmente tem a isca mordida por um peixe, mas não qualquer peixe, e sim um Marlim com cinco metros de comprimento que devia pesar cerca de 700 quilos. Ou seja, maior que o barco de Santiago. Nos dias seguintes, sozinho em alto mar, entre a Corrente do Golfo, Santiago trava um duelo para cansar o peixe e o prender na lateral da embarcação para o levar ao porto. E após isso, ele trava uma outra batalha, desta vez contra tubarões que querem devorar o marlin capturado.

A persistência de Santiago, em uma análise incorreta, poderia ser comparada à persistência de Ahab na perseguição de Moby Dick. Não é o caso, porque a persistência de Santiago não é sobre vingança, ódio ou desejo de matar. Santiago não persegue o peixe como um inimigo, mas como um produto que precisa ser levado para ser vendido. Santiago respeita o marlim pela força que ele demonstra, e pelo que ele pode proporcionar a Santiago. Ele trava várias conversas com o peixe nos dias em que batalham para ver quem se cansa primeiro. E todas com admiração e pesar. Mas essa é a profissão de Santiago, é isso o que ele faz desde sempre, é o propósito de sua vida.

Essa luta de três dias, deixam as mãos e as costas de Santiago sangrando, devido aos cortes da linha de pesca que estão presas em seu corpo para que consiga manter o marlim preso até que se canse e possa ser morto. Santiago come pequenos peixes crus e bebe pequenas porções de água, sempre sem dormir e sempre sem largar a linha. Ele não faz isso pelo reconhecimento de pegar um peixe tão grande, ou mesmo pelo dinheiro que irá ganhar com sua venda. Santiago faz esse sacrifício para provar a si que ainda consegue, que não é um pescador vencido pelo cansaço, pelo tempo ou pela má sorte, que ele ainda tem forças para realizar sua profissão.

E mesmo quando os tubarões começam a atacar, Santiago mantém o respeito pelo peixe capturado e pelos predadores. Faz parte da vida. Os tubarões caçam por alimento, e Santiago é o único entre eles e o marlim. Santiago compreende, mas nem por isso deixa de lutar pelo que conseguiu. Mesmo que não consiga chegar com algo, apenas com a espinha de um peixe gigante.

A partir de um certo ponto da trama, não importa mais o dinheiro que o marlim vale, e é a partir desse ponto que a obra se torna mais pessoal, com um significado maior, que abrange dois grandes questionamentos do ser humano. O primeiro questionamento, é que todos nós, quando envelhecemos, após uma vida sofrida ou não, após uma vida de trabalho ou não, chegamos a um dia que nos questionamos se ainda temos alguma serventia, se não estamos apenas esperando pela morte. Santiago precisa provar que ainda não chegou a sua hora, que, apesar da idade avançada, ele ainda é um pescador, ainda consegue realizar seu trabalho. Não é uma teimosia, é uma necessidade de afirmar a vida, é o último ato desesperado para se convencer de que não está no fim de seus dias. Não importa mais se o peixe vai chegar inteiro ao porto, só importa que ele chegue. É o testemunho de que Santiago ainda vive.

O segundo questionamento é exatamente o ciclo do qual Santiago quer fugir, o do fim da vida. Mesmo o marlim pescado por Santiago ser gigante, no fim, se ele for devorado por tubarões, o que sobra é apenas sua espinha. No fim da vida, de todos nós, independentemente do quanto essa vida tenha sido plena, sobra apenas uma casca vazia. É desse fim que Santiago que fugir, é isso que Santiago quer provar, que ainda não é uma casca vazia.

A caça ao marlin e o embate com os tubarões, é um alegoria do que enfrentamos durante nossa vida. O que torna essa vida justificável, é a forma como nos comportamos, aquilo que fazemos, para quando chegarmos ao fim dela, quando não sobrar mais nada, podermos olhar para trás e emitir um último suspiro de cansaço, mas de tarefa realizada. É assim com Santiago quando ele finalmente chega ao porto. A confirmação de que ele fez tudo o que podia, da melhor forma que podia, não importando se o peixe chegou com carne ou apenas com a espinha.

A vida de Hemingway, por vezes, se assemelhou ao do velho Santiago, só que seu peixe, seu marlim gigante, foi O VELHO E O MAR, foi a prova de que ele ainda conseguia criar algo incrível. E seus tubarões tinham a forma do fantasma do suicídio. Não por menos, seus personagens tinham finais dramáticos na maioria de suas obras, além do tema suicídio aparecer em diversos escritos, cartas e conversas, com uma frequência acima do normal. O pai de Hemingway cometeu suicídio por causa de problemas de saúde e de dinheiro, e a mãe tinha uma personalidade dominadora e cruel. Exemplo disso, foi quando ela enviou para o filho, a pistola com a qual o pai se matou.

Hemingway, aos 61 anos, tinha problemas de hipertensão, diabetes, depressão e perda de memória. No dia 2 de julho, tomou um fuzil de caça e se matou. E da mesma forma que Santiago, que chegou à praia com o resultado de seu esforço, Hemingway deixou um vasto conteúdo de sabedoria e aprendizado em suas obras, clássicos eternos da literatura.


AVALIAÇÃO:


AUTOR: Hernest HEMINNGWAY é considerado pela Academia Sueca como um dos maiores autores de nosso tempo. Hemingway foi o ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1954, feito em grande parte devido à sua obra-prima O velho e o mar (1952), que também foi vencedora do Prêmio Pulitzer de 1952. Sua prosa é admirada pelo seu estilo enxuto e despojado, com uso de frases e parágrafos curtos. Seu estilo é muitas vezes apontado como sua maior herança à Literatura e influenciou os padrões vigentes na época. Autor de uma obra prolífica, escreveu romances, contos, trabalhos de não-ficção e autobiográficos que foram publicados em vida ou postumamente.
TRADUÇÃO: Fernando de Castro FERRO
EDITORA: Bertrand
PUBLICAÇÃO: 2013
PÁGINAS: 126


COMPRAR: Amazon