James Baldwin é um dos autores afro-americanos mais importante de seu tempo. Dentre suas várias obras aclamadas, SE A RUA BEALE FALASSE é a que mais ficou conhecida e que será objeto de análise aqui. A história de amor de Tris e Fonny é algo atemporal e mesmo que tenha sido escrita nos anos 70, nunca foi tão atual. Virou filme ano passado, e o livro terá mais aclamação aqui, já que estamos diante de uma narrativa maravilhosa, vamos conhecer mais?

Tris tem 19 anos, é negra e mora numa comunidade complicada. Atualmente está passando pelo pior momento de sua vida, já que seu noivo, Fonny, também negro, está preso injustamente, acusado de estuprar uma mulher branca. E para piorar seu estado de nervos, Tris está grávida. Mesmo assim trabalha duro numa loja de departamentos para poder pagar um advogando para Fonny. Ela ainda não contou para sua família que está esperando um bebê e tem receio de que essa novidade só piore as coisas. Agora ela precisa vencer seus medos, as incertezas, ao mesmo tempo em que luta pela liberdade do seu grande amor. Ela é jovem, só tem 19 anos e espera uma criança, como suportar esse tanto de fardos? Felizmente ela não estará sozinha nessa jornada.

O livro já se inicia com a trama instalada, a jovem está grávida, o noivo está preso, e o leitor primeiro é jogado para um ato que tem como objetivo conhecer os personagens. Em forma de lembranças, acompanhamos o início do relacionamento do casal, onde eles nos contam que se conheceram quando eram crianças e juntos descobriram tudo o que uma vida a dois pode oferecer. O mais interessante da trama é que ela constrói um romance palpável. Dá para sentir a paixão e todo o caminho que eles percorreram até chegarem nesse trágico momento que vivem. É muita coisa para eles suportarem e, felizmente, a família de Tris não a abandona, pelo o contrário, ela é acolhida com todo o amor e compaixão. Sua irmã é uma das maiores defensoras da liberdade de Fonny e ela luta muito para conseguir um advogado. A trama se passa nos anos 70, num Estados Unidos racista, não muito diferente do atual. A vida do negro não valia nada e mesmo que a segregação racial tenha acabado, o respeito para com esse povo quase não existe.

O livro não gira em torno se o rapaz é culpado ou não, fica claro qual lado ele vai assumir, e para o espectador não há dúvidas sobre esse resultado. Mas não vivemos num mundo mágico, onde só criminosos vão presos, e quando você traz esse panorama para a população negra, tudo é pior. O livro nos apresenta essa triste realidade em que esse povo realmente está sozinho e qualquer coisa pode acontecer com eles. Um bom questionamento também aparece quando o livro trabalha um pouco a vítima do estupro, ela é uma mulher hispânica e, nos Estados Unidos, esse tipo de pessoa também é muito marginalizada. São duas vítimas que foram jogadas uma contra a outra por esse sistema opressor.

Resta para os parentes de Tris ajudarem nessa batalha. A mãe de Tris é uma das personagens mais interessantes que eu já encontrei num livro. Ela realmente entende o que está acontecendo e assume com perfeição o seu lugar essa história. Ela, junto com a irmã de Tris, vai até o fim na luta para libertar Fonny. É um livro que destaca as personagens femininas, elas são a alma da leitura, mas existem dois personagens masculinos que também merecem destaque: o pai de Tris; e o pai do Fonny. Eles também embarcam de cabeça nessa jornada. Mas nem tudo são flores e atrito com outros integrantes da família de Tris e Fonny também estão presentes na narrativa, e uma cena especifica ficou muito marcada na minha mente: o momento em que Tris conta para os pais do seu noivo que ela está grávida. É uma cena forte e dolorosa, as palavras impactam ao mesmo tempo em que machucam.

O autor aqui é um poeta, um autêntico artista, que constrói uma narrativa cheia de belíssimas figuras de linguagem, que exemplificam da melhor maneira possível os sentimentos dos personagens. Os capítulos são pequenos e a trama é humilde, menos de duzentas páginas que são perfeitas na sua proposta. As palavras são intensas e nunca foram tão reais. O final é um misto de justiça, beleza e tristeza. Um romance poético, realista, com alma e, acima de tudo, necessário.

O filme ganhou uma adaptação para os cinemas em 2018, dirigida por Barry Jenkis, o mesmo que venceu o Oscar com o potente drama MOONLIGHT. O filme de SE A RUA BEALE FALASSE é uma obra de arte, e para mim, que assistiu antes de ler, deu para sentir o carinho que o diretor teve com as palavras. Deslumbrante visualmente, adaptou muito bem esse livro potente para as telonas, e o elenco é sensacional. Tanto que a atriz Regina King ganhou o Oscar neste ano de atriz coadjuvante, vivendo a mãe de Tris. Um trabalho delicado que, assim como o livro, merecem ser conferidos!


AVALIAÇĂO:


AUTOR: James BALDWIN foi o primeiro escritor a dizer aos brancos o que os negros americanos pensavam e sentiam. Chegou no auge de sua fama durante a luta dos direitos civis no início da década de 60. Tornou-se mais famosos pelos ensaios do que pelos romances e peças teatrais, mas apesar disso queria se tornar um ficcionista, considerando seus ensaios um trabalho menor. Apesar de escrever e estudar sobre as correspondências entre medos sexuais e raciais, Baldwin era basicamente um puritano que professava a primazia do autoconhecimento em todas as relações humanas.
TRADUÇĂO: Jorio DAUSTER
EDITORA: Companhia das Letras
PUBLICAÇĂO: 2019
PÁGINAS: 196


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