O filme mais polêmico do ano está entre nós. Diretamente da DC, CORINGA é o primeiro filme de grande orçamento a focar em um vilão, talvez o vilão mais famoso das história em quadrinhos. O palhaço do crime está muito vivo no imaginário popular, mas você conhece a sua origem? Posso te convidar a mergulhar nessa intensa trama repleta de loucura e tragédia?

Arthur é homem sonhador, batalhador e portador de uma deficiência mental que o faz rir em momentos de vergonha, medo ou tensão.  Ele trabalha como palhaço em divulgação de comércios, visitas em hospitais e etc.. Sua rotina consiste em ir trabalhar e voltar para casa, onde cuida de sua idosa mãe. Arthur sonha em se tornar um comediante famoso, mas esse intenso sonhador acaba se perdendo pelo caminho, depois de sofrer com a violência intensa na cidade onde mora. As coisas pioram quando o governo interrompe as verbas para as instituições públicas que cuidam de portadores de necessidades especiais. Era lá que Arthur se consultava com profissionais da área e também era lá onde ele era devidamente medicado. Agora vivendo sem emprego, sem remédios e sem ajuda, a mente de Arthur começa a se derramar em caos, onde será que isso vai terminar?

A trama é a origem do icônico Coringa, o vilão clássico do Batman. A história é totalmente original e não se baseia em um quadrinho em especial. Só por fazer isso o filme merece palmas, porque incialmente esse caminho parecia ser uma péssima ideia. Mas, felizmente, o roteiro consegue ser intenso e se destacar em todos os sentidos possíveis. Começando pela atmosfera, o espectador é jogado na Gotham dos anos 70/80, onde a corrupção não tinha limites e o crime estava em todos os lados. O personagem principal recebe 99% de todo o foco do roteiro e isso se torna extremamente necessário, pois estamos trabalhando com uma personalidade especial. Arthur tem uma deficiência, ele procura ajuda, ajuda que ele realmente necessita para se manter estável. Mas o fim dessa ajuda inicia uma cadeia de eventos que culminam naquilo que a gente já sabe, a construção de um dos maiores, mais perigosos e violentos vilões que os quadrinhos já viram.

A trama já nasceu polêmica e, principalmente nos Estados Unidos, ela tem feito muito burburinho negativo, fazendo o filme ser um dos mais controversos dos últimos tempos. E porque todo esse bafafá? A resposta é simples: CORINGA é um filme que reflete com precisão uma realidade que é basicamente a nossa ou o que ela pode se tornar se a gente não tomar cuidado. Temas como porte de armas, algo liberado nos Estados Unidos, precariedade no serviço de saúde, algo que nos Estados Unidos não existe gratuitamente, e por último e mais importante, a falta de cuidado para com as pessoas portadoras de distúrbios mentais. O Coringa é maluco porque se tornou maluco, porque sua mente foi totalmente corrompida ao ponto de talvez nunca mais voltar a ser o que era antes. Tudo isso foi a união de violência, descaso e abandono da parte da sociedade, do governo e até mesmo da sua própria família.

E na base de muito talento, é isso que o roteiro tem a nos apresentar, como a mente  humana pode se deteriorar sem cuidados. O Coringa é um sintoma da sociedade, um psicopata que foi nascendo aos poucos, em um mundo onde ninguém se importou. E isso é exatamente a realidade que nós vivemos nos dias de hoje, é só a gente olhar para esse tanto de ataques terroristas, principalmente focando em ataques nas escolas, onde na maioria das vezes, os terroristas eram pessoas com distúrbios mentais que não faziam tratamento. A construção do grande palhaço do crime é muito sólida e assustadora, por ser algo totalmente compatível com a nossa realidade. Se fosse um filme apenas de estudo humano, a produção já seria um grande destaque, mas estamos falando do Coringa, vilão do Batman, e temos sim no filme uma ponte que liga essas duas personalidades e onde seus caminhos se cruzam. Só posso dizer que essa ligação é muito forte e bem construída, dando respostas a absolutamente tudo que o espectador poderia ter dúvidas, como origem da obsessão do Coringa pelo Batman e o porquê de ele ser literalmente um palhaço. Tudo se liga, tudo tem sentido e uma ligação, um dos roteiros mais completos do ano.

O Coringa é o dono do filme e todos dançam ao seu redor, e quem vive essa lenda nas telonas é Joaquin Phoenix. O já aclamado ator acumula em sua carreira diversos prêmios e três indicações ao Oscar de melhor ator. Seu trabalho aqui pode lhe render mais uma indicação e dessa vez a tão esperada vitória, já que seu desempenho se eleva a um nível nunca antes visto. É uma crescente constante, onde pelo olhar do ator, o espectador sente a loucura crescendo, até se tornar destrutiva. Além de ser um trabalho dramático magnifico, a transformação física também surpreende, com o ator totalmente desfigurado, magro e com um vislumbre totalmente psicótico. Um trabalho difícil e muito bem dosado, em nenhum momento fica apelativo ou cansativo. Sem dúvidas o melhor desempenho masculino do ano e merece demais um lugar no hall da fama, ao lado do grandioso e já falecido Heath Ledger, que mudou o mundo depois do seu desempenho lendário em O CAVALEIRO DAS TREVAS, onde levou um Oscar ao viver o Coringa, em 2008.

Para combinar com seu roteiro incrível e um ator principal lendário, a direção entrega para o espectador um dos filmes mais incômodos do ano. A experiência de assistir CORINGA não é fácil, já que o filme é extremamente violento e pesado, não só graficamente, como também de maneira literal. A gente chega a rir de nervoso com as coisas absurdas e grandiosas que acontecem durante da projeção. O filme não tem “ação” propriamente dita, a produção é um drama psicológico, mas tem sim alguns momentos de tensão e eles chegam para nós de maneiras muito criativas. Novamente usando de contextos extremamente reais, como por exemplo um assassinato no trem, depois de uma moça ser assediada. Duas sequências se destacam como um dos momentos mais grandiosos do ano: a primeira envolve uma perseguição a pé com a polícia, filmada com uma maestria sem igual; e a segunda envolve um programa de TV. É lá que tudo explode e molda o futuro, porque basicamente é um filme que não acaba e talvez nem precise de uma continuação. Depois de o espectador assistir a última cena do filme, já sabemos tudo o que aconteceu e que irá acontecer no futuro.

E ainda dá tempo de elogiar mais: CORINGA é um primor visual com uma fotografia intensa que faz o espectador sentir o desconforto e a dor do personagem principal. A trilha sonora casa perfeitamente com tudo o que está na tela. O trabalho de maquiagem e figurino transforam tudo em realidade, criando a partir de hoje um dos visuais mais icônicos que o cinema já viu.

CORINGA é um filme controverso e que vai dividir o público. Está longe de ser aquele entretenimento divertido que a maioria dos espectadores escolhe quando vai ao cinema e está na margem oposta de tudo que o cinema baseado em quadrinhos está fazendo atualmente. Vá assistir esperando algo totalmente novo. Fórmulas, humor e adrenalina, são coisas que você não vai encontrar nele. É um filme para maiores, então não levem crianças e jovens para assistir, respeite a faixa etária. Uma obra extraordinária, completa, bem construída e muito importante. Sal na ferida para governos corruptos e pessoas hipócritas. O autentico filme do ano!


AVALIAÇÃO:


DIREÇÃO: Todd PHILLIPS
DISTRIBUIÇÃO: Warner Bros.
DURAÇÃO: 2 horas e 2 minutos
ELENCO: Joaquin PHOENIX, Zazie BEETZ, Frances CONROY e Robert DE NIRO




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