O post do Rafael sobre BONS FILMES PARA NAO ASSISTIR NOVAMENTE (se não leu ainda, clique aqui para ler) ficou bastante legal, então resolvi fazer o mesmo para livros. A lista abaixo não se refere aos melhores livros que já li (embora alguns realmente sejam), mas, sim, de livros que eu gostei muito, que me tocaram de alguma forma, mas que eu não desejo ler novamente, porque sofri com a leitura, ou não quero profanar as memórias alegres do que senti pela primeira vez. Então vamos lá!

AS AVENTURAS DE XISTO (Lúcia Machado de Almeida): Este foi o primeiro livro que li na vida. Na época, consumia apenas quadrinhos, e Xisto me mostrou que livros podem ser tãos bons quanto uma HQ. As aventuras do menino corajoso e seu fiel escudeiro, contra um feiticeiro poderoso e malvado, me marcaram de diversas formas. Existem trechos no livro, principalmente a parte em que ele vira um pássaro, que vivem em minha memória. Recentemente, consegui encontrar um exemplar e comecei a ler novamente. Parei. Hoje, sou mais velho, mais maduro, perdi muito da inocência da época, e reparei que iria estragar a primeira experiência e minhas memórias. É um livro que quero ter ao meu lado para sempre, mas que não lerei novamente, porque não quero macular o sentimento que tenho por ele.
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AS VINHAS DA IRA (John Steinbeck): Entre 1930 e 1939, as grandes planícies do Texas e do Oklahoma foram assoladas por centenas de tempestades de poeira que causaram um desastre ecológico sem precedentes, agravaram os efeitos da Grande Depressão, deixaram cerca de meio milhão de americanos sem casa, e provocaram o êxodo de muitos deles para Oeste, nomeadamente para a Califórnia, em busca de trabalho. Quando os Joad perdem a quinta de que eram rendeiros no Oklahoma, juntam-se a milhares de outros que ao longo das estradas se dirigem para Oeste, no sonho de conseguirem uma terra que possam considerar sua. E noite após noite, eles e os seus companheiros de desdita reinventam toda uma sociedade: escolhem-se líderes, redefinem-se códigos implícitos de generosidade, irrompem acessos de violência, de desejo brutal, de raiva assassina. Um clássico, entre os maiores de sempre, demonstra até onde o ser humano pode ir em busca da sobrevivência, sua e a dos seus. Mas mais do que isso, demonstra a força da mulher, como líder, como mãe, como força que equilibra e que mantém a união, a esperança. A forma como a narrativa é escrita e construída, é avassaladora. Compreendia a mensagem, a vida da pessoa não é mais igual. Não é apenas um aprendizado, não é apenas entretenimento, é uma força que derruba para fazer nascer algo melhor e mais resistente. Uma vez lido, você não quer passar de novo pelas mesmas brasas.
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GRANDE SERTÃO VEREDAS (João Guimarães Rosa): Como quase todo clássico brasileiro, não é uma leitura fácil, necessita de total atenção e de uma dose de energia para compreender a subjetividade do texto. Entretanto, é um dos melhores livros de todos os tempos. Seguindo a narrativa de Riobaldo, o personagem principal, um jagunço, que sente um amor proibido por seu amigo, Diadorim. É difícil encontrar alguém que não conheça o segredo por trás desse amor, ou o final do livro, principalmente pela série da Globo, com Tony Ramos, Tarcísio Meira e Bruna Lombardi. Eu não assisti à série, mas o livro ficará para sempre como um dos que possui o romance mais bonito e mais triste da literatura. Não tem como ler de novo, o coração não aguenta.
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O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA (Gabriel Garcia Márquez): Ainda muito jovem, o telegrafista, violinista e poeta, Gabriel Elígio Garciá, se apaixonou por Luiza Márquez, mas o romance enfrentou a oposição do pai da moça, coronel Nicolas, que tentou impedir o casamento, enviando a filha ao interior numa viagem de um ano. Para manter seu amor, Gabriel montou, com a ajuda de amigos telegrafistas, uma rede de comunicação que alcançava Luiza onde ela estivesse. Essa é a história real dos pais de Gabriel García Márquez e foi ponto de partida para o livro, que acompanha a paixão do telegrafista, violinista e poeta Florentino Ariza por Fermina Daza. Entretanto, a estratégia do pai da moça surte efeito, e Fermina casa com outro homem. Mesmo assim, Florentino persiste na sua espera. O livro inicia apresentando os dois personagens com mais de setenta anos, separados, o que entrega ao leitor o conhecimento de que eles não ficaram juntos antes de envelhecer. A obra é uma lição de como a vida, se não for enfrentada, se não enfrentarmos o medo, passa sem ser vivida, sem ser ao lado de quem realmente amamos. O final não poupa o leitor, e eu não conseguiria ler novamente essas últimas páginas. O gosto amargo que fica na boca é cruel.
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O CONTO DA AIA (Margaret Atwood): Margaret Atwood, em 1985, escreveu uma distopia sobre intolerância, totalitarismo, machismo e a total supressão dos direitos femininos, que assusta pelo nível de credibilidade, principalmente nos EUA, após Trump assumir a presidência, e no Brasil, com a presença de um político com ideias semelhantes. Em diversas partes, a leitura é difícil pelo nível de revolta pela forma como as personagens femininas são tratadas, mas torna-se necessária e imprescindível para constatar como é fácil um regime totalitário assumir o poder de forma gradativa. Infelizmente, a maioria das pessoas não tem capacidade cerebral para perceber isso, basta verificar quem está na frente para se tornar presidente do país nas atuais eleições. De qualquer forma, pela carga que o livro transmite, é complicado realizar uma releitura, a revolta só aumenta.
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SENHOR DAS MOSCAS (William Golding): Publicado originalmente em 1954, Senhor das Moscas foi adaptado duas vezes para o cinema e traduzido para 35 idiomas. O clássico já foi visto como uma alegoria, uma parábola, um tratado político e mesmo uma visão do apocalipse, e vendeu, só em língua inglesa, mais de 25 milhões de exemplares. Durante a Segunda Guerra Mundial, um avião cai numa ilha deserta, e seus únicos sobreviventes são um grupo de meninos em idade escolar. Eles descobrem os encantos desse refúgio tropical e, liderados por Ralph, procuram se organizar enquanto esperam um possível resgate. Mas aos poucos, esses garotos, aparentemente inocentes, transformam a ilha numa visceral disputa pelo poder, e sua selvageria rasga a fina superfície da civilidade, que mantinham como uma lembrança remota da vida em sociedade. As páginas finais são uma descrição exata da constatação de como o ser humano é irracional e cruel quando liberto das correntes da moralidade ou da condenação. Um exemplo de como o poder e o ódio consomem e levam à destruição. Mais um exemplo dos dias que vivemos atualmente. E, por isso mesmo, é difícil efetuar uma segunda leitura, já sabendo como o livro termina, como terminam os personagens.
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OS MENINOS DA RUA PAULO (Ferenc Molnár): A história dos garotos que defendem um pedaço de terra, que serve de palco para as brincadeiras, tornou-se um best-seller e inspirou cineastas por todo o mundo. Está para nascer uma geração que não se identifique com o espírito de amizade e união presente no livro. Os garotos da Sociedade do Betume tinham duas importantes tarefas: manter o betume – símbolo da sociedade – sempre molhado, por meio da mastigação, e defender o grund, quartel general onde jogavam péla. Eis que os camisas-vermelhas, desterrados e, conseqüentemente, impedidos de jogar péla, declaram guerra à Sociedade e decidem tomar-lhe o grund. Do líder Boka ao soldado raso Nemcsek, a Sociedade do Betume se organiza para a grande batalha de Budapeste do começo do século. O que era brincadeira de criança transformou-se num belo retrato da infância. O autor cativa o leitor e o leva para uma infância permeada pela amizade, pela fidelidade, pelo caráter, pela honestidade e pela inocência. Então, quando o leitor se sente confortável, o autor nos dá um soco no rosto e mostra a realidade como ela é, sem qualquer piedade. O último capítulo do livro é o choque que transforma uma criança em um homem. Quando li, confesso, passei dias sem conseguir pensar em mais nada, tamanho o choque. Uma leitura que marca para a vida. Não tenho como ler novamente, mesmo porque cada descrição ficou marcada em mim.
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POR QUEM OS SINOS DOBRAM (Ernest Hemingway): A trama gira em torno de Robert, um americano integrante das Brigadas Internacionais, durante a Guerra Civil Espanhola, que luta ao lado do governo democrático e republicano, recebendo a missão de dinamitar uma ponte. Com ele está um grupo de guerrilheiros/ciganos, integrado pela bela Maria. A relação entre Robert e Maria acabou por se tornar uma das mais inesquecíveis histórias de amor da literatura moderna. Hemingway começou a escrever o livro em 1939, em Cuba, onde morava, e foi publicado em 1940. Apesar do sucesso de crítica e público, por razões políticas, deixou de receber o Pullitzer, o maior prêmio literário dos EUA, apesar de eleito por unanimidade pelos jurados. Essa é uma das histórias que mais me marcou na época em que li, uns cinco anos atrás, e o final é simplesmente arrebatador. A frase dita por um dos personagens, ecoa na minha mente até hoje: “Por quem os sinos dobram? Eles dobram por mim…”. Por isso, não tem como ler novamente. Só de lembrar, já tenho vontade de chorar.
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PRECISAMOS FALAR SOBRE KEVIN (Lionel Shriver): Aos 15 anos de idade, Kevin mata nove colegas de escola, seu pai e sua irmã. Enquanto ele cumpre pena, a mãe Eva amarga a monstruosidade do filho. Entre culpa e solidão, ela apenas sobrevive. A vida normal se esvai no escândalo, no pagamento dos advogados, nos olhares sociais tortos. Transposto o primeiro estágio da perplexidade, um ano e oito meses depois, ela dá início a uma correspondência com o marido, único interlocutor capaz de entender a tragédia, apesar de falecido. Cada carta é uma ode e uma desconstrução do amor. Não sobra uma só emoção inaudita no relato da mulher de ascendência armênia, até então uma bem-sucedida autora de guias de viagem. Uma leitura que quebra seu coração, que demonstra a responsabilidade de ser pai e mãe, como uma criança com problemas psicológicos pode cair no abismo se não for tratada por especialistas, se não receber uma educação completa, com atenção e amor. A dor que a narrativa transmite é tão forte, que, ao fim da leitura, eu me senti desgastado, arrasado. Não é uma leitura que desejo repetir, não quero sentir novamente o que senti na primeira vez. Por isso, nem sequer existe resenha no blog. Por enquanto…
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VIDAS SECAS (Graciliano Ramos): A história do vaqueiro Fabiano e sua gente, que é impulsionada pela seca, áspera e cruel, do sertão nordestino, é uma das que mais me marcaram na adolescência. Como o próprio autor disse, na história não existe paisagens, não existem diálogos, não existe amor. A preocupação dessa gente é sobreviver, comer, beber, não há tempo para mais nada. Foi através dele que cheguei na realidade desse povo sofrido, de como nós, que vivemos em uma cidade onde nada falta, somos privilegiados, como não temos qualquer consciência do que é sofrer, como é horrível o sol nas costas. Uma leitura que não pretende fazer novamente, mas que guardarei para sempre.
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