O que aconteceria se fosse dada a Hitler uma segunda chance, permitindo-lhe reencarnar no Brasil da década de 70? E se ele se tornasse um político influente, concorrendo em 2018 ao cargo máximo do Executivo, Presidente da República?

A narrativa de DO INFERNO AO PLANALTO se assemelha a alguém contando para os netos algo que aconteceu muito tempo atrás, tem aquela sensação de história de ficção que pode ser verdade, deixa uma dúvida em que lê ou em quem ouve. É uma forma mais pessoal de descrever as situações, pouco descritiva, como uma conversa informal, e isso acaba por conseguir aproximar mais o leitor daquilo que está sendo narrado. E isso é um acerto, por causa do tom fantástico e, por vezes, absurdo do que acontece.

Hitler morre, chega ao inferno e consegue receber um julgamento, onde sua defesa utiliza de algumas passagens da Bíblia para favorecê-lo. Isso porque ele não quer passar a eternidade ao lado de demônios, ele deseja retornar, e o inferno vê nesse desejo uma chance de conquista, uma vez que é proibido ao Diabo sair de onde está. A tal abertura que sua defesa utiliza, é sobre a vinda de um falso profeta que seria o seu representante na Terra. E assim, Hitler reencarna, trinta e três anos depois de sua morte, no corpo de um recém nascido que recebe o nome de Marcus.

Acontece um pulo no tempo e estamos em 2015, quando Marcus é Deputado Federal do Rio de Janeiro. Ele tem um discurso de ódio, é a favor das armas, acha que todo bandido deve ser morto e que a população tem o direito de se proteger. Em uma sessão, ele discute com uma rival política e a ofende. Priscila, sua assessora e amante, o alerta que tal posição pode levá-lo a perder eleitores. Mas Marcus acha exatamente o contrário. E após algumas situações que envolvem ataques a traficantes, sequestros, chantagens, armações políticas, Marcus ganha popularidade e consegue ter apoio para se candidatar a Presidente da República.

Como proposta de campanha, ele consegue mascarar seus planos de que quem deseja segurança, que compre uma arma; quem deseja educação, que pague uma mensalidade em um colégio particular; quem deseja saúde, que pague por um plano de saúde, convencendo a maior parte dos eleitores, de que isso é o que eles desejam, que isso é a saída para o país e o mais certo a ser realizado. E assim, Marcus, com a assessoria de Priscila, e o apoio da esposa, Aline, consegue ser eleito. Mas por pouco tempo…

Obviamente, DO INFERNO AO PLANALTO é uma alegoria ao atual momento da política brasileira. Embora várias passagens lembrem muito do que se viveu no país nos últimos meses, elas são usadas de uma forma que as distanciam na mesma proporção. Há um excesso de violência sexual, bem como fetiches sadomasoquistas, que envolvem os personagens. Uma determinada passagem onde Priscila é sequestrada por um General e submetida a uma tortura sexual é particularmente difícil de ler.

Apesar de Marcus ser o personagem principal, a reencarnação de Hitler, não é ele que move a história e nem é ele quem elabora os planos para suas conquistas, mas, sim, Priscila. E essa abordagem é interessante, esse domínio que Priscila tem sobre ele, de forma discreta, e o domínio que ela exerce sobre todos os outros, inclusive com Aline. Ela não tem limite para seus planos, e a forma como ela se vinga do tal General que a sequestrou, tem descrições tão pesadas e explícitas quanto a tortura que sofreu.

Claro que existe uma explicação do motivo de Priscila ser como é e da influência que ela exerce sobre todos. Entretanto, achei a representação de Marcus bem distante de quem Hitler foi. Hoje em dia, há um exagero e uma insistência na comparação de pessoas que utilizam um discurso de ódio com Hitler. O genocida austríaco que guiou a Alemanha contra o mundo, não está representando em Marcus ou em qualquer pessoa da nossa realidade, felizmente. E embora Hitler não fosse um primor de inteligência, era um excelente estrategista, coisa que não acontece com Marcus. Nem sequer sua maldade é semelhante.

De qualquer forma, é uma alegoria sobre como a população é facilmente manipulada, principalmente aquela parcela que já detém dentro uma grande parcela de ódio, pronta para explodir contra quem não concorda com seus ideais, ou falta deles. Mesmo assim, considero que a mensagem que o livro tenta passar, não fica muito clara, porque se mistura com uma violência excessiva e com um exagero de situações que se misturam com partes religiosas de forma pouco harmoniosa.

DO INFERNO AO PLANALTO é uma leitura que incomoda pela violência, por ligações religiosas e políticas, mas principalmente por uma semelhança muito próxima daquilo que vivenciamos nos dias de hoje. Embora a narrativa seja exagerada e se perca em algumas partes, é curiosa exatamente pela mensagem de como se manipula a opinião pública e de como ideias perigosas são facilmente inseridas em mentes fracas.


AVALIAÇAO:


AUTOR: Andre L. BRAGA
EDITORA: Chiado
PUBLICAÇAO: 2018
PÁGINAS: 372


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