Um dos filmes mais comentados dos últimos dias se chama O POÇO. O filme espanhol original Netflix é um dos longas mais estranhos do ano e que, por incrível que pareça, tem uma trama super simples, mas que abre diversas linhas de pensamentos, questionamentos e significados. Interessante, né?

A trama é simples: numa estranha cadeia em forma de prédio, uma mesa de comida desce todos os dias repleta de alimentos e permanece por um tempo em cada andar. A cadeia tem uma infinidade de andares e a seleção de quem fica em qual andar é aleatória e muda a cada mês. Um dia eu posso estar nos primeiros andares, recebendo mais comida, e no outro eu posso estar lá em baixo, onde nessa altura, a mesa já chega parcialmente ou totalmente vazia.

Os detentos dessa cadeia são os dos mais variados, e ao entrar, eles podem levar algum objeto de sua escolha. Cada cela tem duas camas, com dois detentos por cela, uma torneira com água e um grande buraco no meio, onde passa a mesa de comida, permanecendo em cada andar por alguns segundos a cada dia. A única regra de convivência nessa cadeia é que o detento não pode guardar comida para depois, ela precisa ser consumida no momento em que a mesa está na cela. Fora isso tudo está liberado.

O espectador acompanha a trama pelo ponto de vista de um homem que escolheu entrar nessa cadeia para parar de fumar, junto com ele veio um livro de sua escolha e o mesmo divide a cela com um homem idoso. É nessa convivência que entendemos como as coisas funcionam e como acontece essa grande roleta russa da mudança, onde um dia eu estou em cima, aproveitando, e no outro no andar mais profundo.

O roteiro é simples e está aqui apenas com uma grande mensagem que remete muito à nossa sociedade. Literalmente onde os de cima, ricos e privilegiados, aproveitam sem se importar com quem está embaixo, os pobres, e se eles têm o mínimo para sobreviver. O filme exemplifica isso quando um dos detentos tenta a todo custo criar um sistema onde todos possam comer, mas quando o dialogo não funciona, apenas a violência parece ser a única solução.

O filme é extremamente forte e nojento, ele traz para a tela o auge do extremismo humano que acontece com todos nós de maneiras diferentes, mais nas entrelinhas por assim dizer. O choque é usado para fixar a ideia. E na base é só isso mesmo, a convivência entre detentos diferentes, mudança de andares, e com essas mudanças, vem a incerteza de não saber e não poder mais confiar em que está dividindo a cela com você.

Não é um filme para todos, pois o diretor não quis economizar no choque ao mostrar violência extrema e explicita, além de diversas cenas pesadas de revirar o estômago. Pra mim não soou apelativo, a mensagem foi transmitida, mas é natural outros sentirem que algo possa ter passado dos limites. No terceiro ato, nós temos um gancho que quebra a normalidade da trama. Agora dois detentos se juntam para quebrar o ciclo e fazer uma mudança. Esse arco vem num momento necessário, não deixando o filme cair na mesmice, e encerra o longa de maneira satisfatória. Trazendo novamente muito simbolismo e possíveis significados ou até mesmo não trazendo nada, o filme deixa o espectador trabalhar a mente. Para mim foi um desfecho incrível, para outros nem tanto. Mas para um filme que veio para mexer com o espectador, o final não poderia ser outro além de estranho, né?

Tecnicamente o filme é extraordinário inovando nos efeitos visuais e na direção de arte. Toda a física envolvendo essa estranha cadeia é muito interessante e visualmente belíssima. A fotografia do filme é bruta e rústica, preenchendo muito bem esse universo de caos. O elenco inteiro está afinadíssimo e todos entregam desempenhos acima da média, principalmente o homem idoso que divide a cela com o protagonista. A direção também é muito talentosa e cria uma narrativa coesa muito bem organizada, são uma hora e trinta minutos que passam voando.

De longe um dos melhores originais Netflix, que as vezes são sinônimo de quantidade e não de qualidade. Não é um filme para qualquer um e principalmente não é uma experiencia para menores de dezoito anos. Mas para quem for se aventurar, eu garanto uma viagem bem esquisita, que vai resultar no final alguma grande emoção no espectador que pode ser satisfação, indiferença, supressa ou ódio. Mas quem não experimentar, nunca vai descobrir. E aí, topa entrar nessa cadeia?


DIREÇÃO: Galder GAZTELU-URRUTIA
DISTRIBUIÇÃO: Netflix
DURAÇÃO: 1 hora e 34 minutos
ELENCO: Ivan MASSAGUÉ, Zorion EGUILEOR, Antonia SAN JUAN





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