Com o merecido sucesso de JEREMIAS – PELE (resenha aqui), que inclusive ganhou o prêmio Jabuti de Histórias em Quadrinhos, era mais do que esperado, e necessário, existir uma sequência. JEREMIAS – ALMA é a segunda aventura de Jeremias na descoberta de quem são seus antepassados, para compreender quem ele é e qual o seu papel em um mundo ainda racista e preconceituoso.
Jeremias, em uma conversa com Franjinha, percebe que existe um conhecimento compartilhado do sucesso de pessoas brancas. Ele, então, questiona os pais se não existem personalidades negras famosas do passado e qual é a história dos antepassados de sua família. O pai de Jeremias decide levar o filho à casa dos avós, onde ele sabe que poderá dar respostas melhores e mais profundas. E isso realmente acontece, quando Jeremias é levado pela avó até o cemitério, para visitar o túmulo de sua bisavó. Jeremias ouve a história de quem era essa mulher, e sobre quem era a mãe dela, que chegou a viver na época da escravidão no Brasil. Ao voltar para casa, a família encontra uma livraria, onde está acontecendo a celebração de uma noite especial, e onde Jeremias tem, pela primeira vez, contato com muitas pessoas negras famosas e importantes em diversas áreas.
Em paralelo a essa descoberta, Jeremias precisa lidar com um menino do bairro que gosta de representar peças de teatro ao ar livre. Só que esse menino, branco, se apropria de obras conhecidas como se fossem suas. Jeremias, acidentalmente, o desmascara. Com isso, claro, ganha um inimigo. A vingança do garoto contra Jeremias, vem da forma que apenas racistas sabem fazer: usar a cor da pele como motivo para diminuir e ridicularizar. Mas Jeremias, agora que compreende melhor quem é e quais suas origens, não se deixa mais amedrontar, e sabe como responder a esses ataques com a classe que o personagem exala.
Rafael Calça criou uma história que usa Jeremias como catalizador para lembrar aos leitores que alguns dos maiores pilares culturais do Brasil são negros. Como Machado de Assis e Maria Firmina dos Reis, por exemplo. Mas também menciona personalidades internacionais, como Alexandre Dumas, em uma passagem particularmente comum de acontecer na vida real, quando uma pessoa branca tenta se apropriar de uma obra que não é sua, ainda mais essa pessoa sendo racista e ignorar que a obra apropriada foi escrita por uma pessoa negra.
JEREMIAS – ALMA, como foi o primeiro volume, é uma obra indispensável para se ler, para se compartilhar, para se discutir nas escolas, onde as crianças ainda não possuem a maturidade para discernir sobre o que é certo e o que é errado, sobre igualdade e respeito. E isso fica muito forte em uma parte em particular, quando os pais de Jeremias reformam a casa onde estão morando, e na parte de trás, onde existiam os cômodos dos empregados, os muros são derrubados e, no lugar, aparece algo diferente, que representa perfeitamente a liberdade e a igualdade. Muros não apenas físicos, mas de ideias e preconceitos.
Antes de finalizar, preciso mencionar o final da HQ, sem spoilers, que é particularmente emocionante. No início, Jeremias escreve um quadrinho e mostra para os pais. Embora a gente não conheça o conteúdo da história, por uma conversa com os pais, dá para perceber que ele ainda não encontrou a linha certa de sua narrativa. Ao fim de JEREMIAS – ALMA, Jeremias conta para sua avó, a nova história que está escrevendo e desenhando. E é muito emocionante.
AUTOR: Rafael CALÇA
ILUSTRADOR: Jefferson COSTA
EDITORA: Panini
PUBLICAÇÃO: 2020
PÁGINAS: 96
COMPRAR: Amazon
Antes de falar de Jeremias e sua certa inocência diante do racismo e destes questionamentos de vida, de cores, de história,eu preciso falar sobre a relação dele com a avó.
Juro que me emocionei, pois fiquei imaginando isso. Tive essa relação, de visitar o passado através dos olhos dela, que hoje já não sai mais da cama e por muitas vezes não me reconhece.
Jeremias é a tradução perfeita da pureza diante da maldade,mas também a esperança de saber buscar sua história!
Beijo
É sim, a história é muito sensível, toca em pontos importantes, ainda mais para quem sente os preconceitos.