Anna Fox mora sozinha na bela casa que um dia abrigou sua família feliz. Separada do marido e da filha e sofrendo de uma fobia que a mantém reclusa, ela passa os dias bebendo (muito) vinho, assistindo a filmes antigos, conversando com estranhos na internet e… espionando os vizinhos. Quando os Russells – pai, mãe e o filho adolescente – se mudam para a casa do outro lado do parque, Anna fica obcecada por aquela família perfeita. Até que certa noite, bisbilhotando através de sua câmera, ela vê na casa deles algo que a deixa aterrorizada e faz seu mundo – e seus segredos chocantes – começar a ruir.

É fácil reconhecer a competência de um escritor em montar uma narrativa, quando ele consegue prender a atenção do leitor com acontecimentos triviais, transformando-os em algo que não parece trivial. Finn possui essa qualidade, uma vez que ele, sem tornar a história maçante, mantém toda a ação de A MULHER NA JANELA dentro de uma casa, onde a personagem principal vagueia por momentos de lucidez e embriaguez, sem saber, na maioria das vezes, em qual momento está. E a curiosidade do leitor é aguçada exatamente por isso, por também não conseguir identificar se está sendo enganado pelo que a personagem conta, ou se tudo é a pura verdade.

Ele também usa a técnica do conta-gotas, ou seja, vai destrinchando um segredo aos poucos, sem dar muita informação ao leitor de uma só vez. Não apenas sobre quem morreu, quem matou, mas, também, sobre o que realmente aconteceu com Anna, a personagem principal, a ponto de deixá-la com agorafobia, um transtorno psicológico que a impede de frequentar espaços abertos, como a rua. Isso cria uma crescente ansiedade de se descobrir de uma vez o que está acontecendo, e quando se descobre, leva-se aquele susto, ou aquela surpresa.

No caso de A MULHER NA JANELA, as duas revelações são meio que esperadas. O autor deixa pistas por todos os capítulos sobre esses segredos, basta o leitor prestar um pouco de atenção no que alguns personagens fazem, ou no que eles dizem. De qualquer forma, não há como ter certeza, apenas desconfianças. E é reconfortante confirmar aquilo que se suspeita. Isso quer dizer que a história consegue passar uma coerência, uma lógica, que é perfeitamente assimilada pelo leitor. E, novamente, isso só consegue fazer quem é hábil na narrativa.

Anna é a protagonista e narradora, e o autor consegue passar toda a confusão mental e emocional que a personagem vive. Conforme a trama avança e o estado dela deteriora, acontece uma coisa que define como se pode sentir imerso em um livro: o desespero por tentar descobrir se a personagem está alucinando ou não, é totalmente compartilhado com quem lê. Dá para sentir toda a angústia e frustração por não se conseguir comprovar algo, por não encontrar argumentos inequívocos do que aconteceu com a mulher que morava na casa vizinha. Ou até mesmo se ela existia. Aos poucos, quando Anna, mesmo bêbada e sob efeitos dos medicamentos, se esforça para manter o raciocínio lógico, é possível sentir uma grande empatia com a personagem. Ou pena.

Entretanto, apesar de toda a competência de Finn em construir seus personagens de maneira bastante segura e convincente, apesar de ter o domínio da narrativa e saber muito bem como prender a atenção do leitor, ele não pode receber os méritos da originalidade da história, uma vez que A MULHER NA JANELA segue todos os passos de uma das obras mais conhecidas de Alfred Hitchcock, JANELA INDISCRETA. E isso, para qualquer pessoa minimamente coerente e imparcial, fica bastante evidente. Basta analisar o quanto a estrutura que compõe a obra segue a mesma estrutura do filme de Hitchcock, e até o título da obra remete ao mesmo.

Jeff, o protagonista de JANELA INDISCRETA, bem como Anna, estão presos em casa por motivos de saúde; ambos usam o tempo ocioso para observar os vizinhos com o uso de uma câmera; ambos assistem a uma cena em uma das casas que indica que uma mulher foi morta; ambos são ajudados por um policial simpático, mas que não acredita neles; ambos têm uma pessoa em casa que ajuda a cuidar das arrumações; ambos confrontam o suspeito do assassinato em um momento de desespero; ambos acusam o suspeito e são desmentidos na frente da polícia; ambos são acusados de inventarem tudo ou estarem tendo alucinações; ambos recebem em casa o assassino, que tenta matá-los.

Óbvio que existem diferenças em alguns pontos, como em quem é o assassino, no motivo do trauma da Anna e mais em algumas outras partes, mas todo o esqueleto e o clímax é essencialmente o mesmo. Isso não quer dizer que A MULHER NA JANELA seja ruim, pelo contrário, é uma cópia de qualidade. Ainda mais para quem nunca assistiu a JANELA INDISCRETA. Inclusive, se você tiver oportunidade, assista, sentirá basicamente o mesmo que sentiu lendo a obra de Finn.


AUTOR: A. J. FINN
TRADUÇÃO: Marcelo MENDES
EDITORA: Arqueiro
PUBLICAÇÃO: 2018
PÁGINAS: 352


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