Sabem aquele quebra-cabeças que você compra e quando abre a caixa, todas as peças estão misturadas e você não tem ideia por onde começar? É mais ou menos essa a sensação que você irá ter no começo da leitura de AS OUTRAS PESSOAS, novo livro de uma das autoras mais promissoras no gênero mistério que tenho lido nos últimos anos.

Gabe está voltando para casa de carro, preso no trânsito. Enquanto espera, repara que o carro da frente tem o vidro traseiro cheio de adesivos, quase por inteiro. E no meio desses adesivos, de repente, aparece o rosto de uma menina de uns 5 anos de idade. Uma garotinha que é muito parecida com sua filha Izzy. Quando a garota vê Gabe, ela abre a boca e pronuncia “papai”. Então o motorista puxa a menina, acelera, e consegue desaparecer por entre os outros carros da rodovia. Gabe fica confuso, não poderia ser Izzy, ela está em casa com a mãe. Como estaria dentro de um carro com outra pessoa?

Quando Gabe chega em casa, o pior: a polícia está no local, porque sua esposa e Izzy foram assassinadas. Mas Gabe não acredita, ele tem certeza que aquela menina morta não é sua filha, sua filha foi sequestrada por alguém que colocou outra garota no lugar. Mas ele não tem como provar. Além de que passa a ser o principal suspeito do crime.

Três anos mais tarde, Gabe está em um cafeteria à beira da mesma rodovia em que viu pela última vez aquela que ele pensa ser sua filha. Nesses anos, ele entrou na Deep Web e começou uma busca por qualquer pista que o pudesse levar à verdade do que aconteceu naquele dia em que a esposa e a criança foram mortas. Ele perdeu tudo, todos os amigos, inclusive a família da esposa, que o culpam do que aconteceu.

Nessa cafeteria trabalha Katie, uma moça que teve o pai assassinado e que reconhece em Gabe uma dor profunda. Ela tem curiosidade para saber porque ele sempre passa por ali, porque vive indo e vindo pela rodovia, sempre procurando por alguma coisa. Ela reconhece nele uma dor que ela mesma sente. Queria poder ajudar, mas não sabe como.

E também acompanhamos Fran e sua filha Alice, de 8 anos de idade. Elas estão viajando, fugindo de algo, com um destino misterioso, um lugar onde elas podem encontrar refúgio e segurança. Alice sofre de sonhos perturbadores. Ela sonha com umam garota pálida, dormindo em um quarto completamente branco. O único momento em que a garota pálida desperta, é quando Alice dorme e elas conseguem conversar através de espelhos. Elas sentem medo, porque alguem chamado de Homem de Areia está a caminho.

Gabe conta com a ajuda de um homem cuja alcunha é o Samaritano. Ele descobre um carro abandonado em um terreno na rodovia. Dentro do automóvel, está um cadáver e um caderno com apenas uma frase: as outras pessoas. E então que Gabe finalmente consegue uma pista que irá levá-lo às respostas do que aconteceu 3 anos atrás, e também irá ligar a sua vida às vidas de Katie, Fran e Alice.

Como disse no início, você se sentirá perdido no início da leitura devido à quantidade de perguntas que são jogadas no seu colo: a garota no carro era Izzy? Se era, quem morreu? Por quê morreu? E se não era, quem era? De quem Fran e Alice estão fugindo? Qual a ligação de Katie com tudo isso? O que é as outras pessoas? Quem é o Samaritano? Se Izzy foi sequestrada, por que foi? Por que mataram a esposa de Gabe? Por que Gabe? Quem é a garota pálida? E o Homem de Areia? Como Alice sonha com isso? E muitas outras perguntas.

A narrativa é em terceira pessoa e os capítulos, todos muito curtos, com a apenas 4 ou 5 páginas, são intercalados entre Gabe, Katie, e Fran e Alice. E sempre terminam em um pequeno clímax, o que torna a leitura muito urgente, quase desesperada. E conforme os capítulos passam, algumas informações vão sendo colocadas para o leitor, e então tudo começa a fazer sentido, exatamente quando começamos a colocar as peças de um quebra-cabeças no lugar, a imagem começa a ficar nítida. E acredite, todas as peças serão dadas e tudo será esclarecido.

Gabe, Katie, Fran e Alice são personagens muito bem construídos, totalmente diferentes entre si, com características, personalidades, motivações e comportamentos diferentes. E todos os quatro são fáceis de se gostar, porque os quatro também buscam por respostas, por soluções para problemas que enfrentam, alguns deles perigosos, mortais até.

Existe, sim, uma áurea de sobrenatural na história, em especial na parte em que envolve os sonhos de Alice com a garota pálida. Mas não é nada muito abrangente e nem sequer chega a influenciar o rumo da história, apenas um pequeno empurrão na conclusão. Este é o terceiro livro da autora, e nele ela praticamente abandona o sobrenatural e investe definitivamente no thriller de mistério. Tudo o que acontece está relacionado às outras pessoas, algo que, obviamente não vou dizer o que é, porque iria estragar completamente sua leitura. Mas no momento em que é revelado o que são as outras pessoas, então quase que imediatamente todas as histórias, de Gabe, Katie, Fran e Alice, passam a fazer sentido e compreendemos o que está realmente acontecendo.

AS OUTRAS PESSOAS é o melhor dos três livros da autora, é o que eu mais gostei, é o mais bem construído, com uma história bem original, personagens mais cativantes, um mistério muito inteligente, e uma narrativa muito, muito bem direcionada para deixar o leitor preso nas páginas até o final. Uma das melhores leituras do ano do gênero, e fica lindo junto dos outros dois livros. Ah, e cuidado, pode ser que As Outras Pessoas um dia visitem você.


AUTORA: C. J. TUDOR
TRADUÇÃO: Giu ALONSO
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇÃO: 2020
PÁGINAS: 304


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