Através de um narrador não identificado, pelo menos neste primeiro volume, acompanhamos o início do fim do mundo. O leitor não recebe informações de como esse fim se dará, nem quanto tempo levará para acontecer, apenas recebemos a informação de que o fim se inicia com a transformação de uma menina em uma árvore.

Meg tem 8 anos de idade, e em um dia como qualquer outro, ela acorda com uma coceira no braço. Sua mãe, Loretta, acha que é apenas uma alergia. Mas conforme as horas passam, a coceira se transforma em casca, se alastra para as costas, onde nasce um pequeno galho com uma folha. O mesmo começa a acontecer com o resto do corpo da menina. Desesperada, Loretta e o outro filho, Josh, levam Meg para o hospital. Mas, no caminho, são abordados por um grupo de homens armados, que começam a atirar para matar.

Meg, Loretta e Josh só sobrevivem, porque aparece um velho, também armado, e mata todos os homens. Esse velho se chama Judd e é o avô de Meg e Josh, por parte de pai. Ele diz que o trio precisa ir com ele, se quiserem sobreviver. Loretta se nega, porque seu marido, Darcy, filho de Judd, abandonou a família sem qualquer explicação, e Judd nunca se tornou presente para apoiá-la na criação dos filhos. Mas Judd afirma que é o único que conhece quem pode ajudar Meg, antes que ela se transforme em uma árvore completa, e também é o único que pode levar a família em segurança, porque existe um grupo que pretende matar Meg antes que a transformação se complete.

FAMILY TREE é um encadernado que reúne as primeiras quatro edições, de um total de doze, de uma história que conta como o mundo acabou e como uma família tenta sobreviver no meio de um caos, que parece ser resultado da revolta da natureza contra o ser humano. Neste primeiro volume, recebemos apenas perguntas: por que as pessoas estão se transformando em árvores? Como isso irá provocar o fim do mundo? Quem é o narrador da história, que apesar de estar no futuro, quando o fim do mundo já aconteceu, ainda está vivo? Por que Meg precisa ser morta? Como essas transformações começaram? E algumas outras perguntas, que não vou colocar aqui, porque seriam spoiler do que acontece do meio para o final do volume.

Apesar da ação frenética da história, o autor consegue inserir profundidade nos personagens, sem precisar ser extenso nas explicações. Em poucos quadros, o leitor compreende que Loretta enfrenta dificuldades para conciliar o trabalho com a educação dos dois filhos e se sente abandonado pelo marido; Josh é adolescente, rebelde, problemático, principalmente por não entender porque o pai os abandonou; Meg é carente de atenção e se sente sozinha; Judd sabe dessas dificuldades, mas sua prioridade é salvar a vida do filho, Darcy (e não vou contar o motivo para não estragar a surpresa); e Darcy, ao contrário do que a família pensa, teve um motivo justo para fugir.

O melhor personagem, aquele que conquista com poucas páginas, sem qualquer dúvida, é Judd. O que pensamos sobre ele, muda conforme as páginas avançam, e a admiração é crescente. Ele se sacrifica pela família do filho, se sacrifica pelo filho, e está pronto para fazer qualquer concessão para o bem de todos. É uma máquina de destruição que passa por cima de todos que se colocam na frente.

A arte da HQ segue o padrão de estranheza da história. As cores são de uma tonalidade pastel e bem escassas. Não é um preto e branco, mas não há mais do que três ou quatro variações em cada página. Os enquadramentos são inspirados, criativos, e se unem aos personagens e ao que o roteiro conta. Isso demanda que o leitor tenha um pouco de atenção para conseguir apreciar toda a complexidade dessa união dos desenhos com o enquadramento. É quase como um complemento do que está sendo contado e, por vezes, até expande a narrativa.

FAMILY TREE segue uma família desconstruída no meio de um drama e uma luta pela sobrevivência. É uma narrativa comum usada pelo autor, mas que é sempre inserida em variações surpreendentes e que se tornam únicas. Eu confesso que não sou fã de histórias tão estranhas e relutei em ler a HQ, ainda mais que já estou seguindo uma outra série do Lemire. Entretanto, quando comecei a leitura, constatei que a estranheza é apenas aparente. Na verdade, com exceção da transformação de Meg, todo o resto é uma aventura de perseguição com muita ação. Ainda bem que não desisti da leitura. Aproveite a dica e coloque a HQ na sua lista de compras.


AUTOR: Jeff LEMIRE
ILUSTRADOR: Phil HESTER, Eric GAPSTUR e Ryan CODY
TRADUÇÃO: Fernando SCHEIBE
EDITORA: Intrínseca
PUBLICAÇÃO: 2021
PÁGINAS: 96


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