Meu primeiro contato com ELEANOR E PARK foi aos treze anos, e lembro que na época tinha gostado bastante da história. Sim, era um romance como os outros, mas recordo que eu o havia colocado na lista de livros que provavelmente gostaria de ler novamente. Há algum tempo, eu não parava para prestar muita atenção sobre o que comentavam sobre ele, até que um dia, li uma resenha que apontava vários detalhes que eu não me recordava, talvez pelo tempo que havia passado desde quando eu tinha lido. Essa foi a minha deixa para abrir novamente esse livro. E, sim, com certeza tive uma percepção diferente sobre a narrativa, então vim contar um pouquinho das minhas duas versões entendendo ELEANOR E PARK.

O romance tem dois cenários principais: o ônibus escolar, onde se conheceram, e a escola. Eleanor é nova no bairro e acaba de voltar a morar com a família, após um ano morando com amigos da mãe, por ter sido expulsa de casa por Richie (o padrasto). O relacionamento com ele sempre foi conturbado, principalmente devido à agressividade e ao envolvimento com drogas. Para complicar a situação, ela é nova na escola e sua aparência não é como o “padrão”: ela é ruiva, sardenta, gorda. Isso faz com que o bullying seja marca presente em sua rotina desde o primeiro dia.

Ela conhece Park logo no início da história, no primeiro episódio em que ela é vítima do típico bullying retratado nas escolas. Estavam no ônibus e por ser “diferente”, as pessoas não deixaram que ela se sentasse no mesmo banco. Foi quanto Park, a contra gosto, cedeu um espaço a ela. As primeiras viagens foram bastante silenciosas, fato que vai se quebrando à medida que Eleanor tenta ler discretamente os gibis que o menino leva consigo. Pouco a pouco, eles começam a trocar algumas palavras, HQs e suas coleções de músicas favoritas.

A história é carregada de citações sobre quadrinhos, bandas e outros elementos que, quando o leitor sabe do que se tratam, dão um charme a mais. É gostoso reconhecer um ou outro momento, que todos nós acabamos passando pelo menos alguma vez enquanto estamos nos apaixonando pela primeira vez: as incertezas, o fascínio, a sensação de que o coração vai sair bela boca simplesmente ao ver a outra pessoa, o “será que vai ser pra sempre?”…

Eleanor aparece em um primeiro momento como uma pessoa mais segura sobre si, do ponto de vista de não se “deixar abalar” por comentários de outras pessoas. Porém esse comportamento oscila muito a depender do momento. Park apresenta um padrão de comportamento em que ele perde a capa de mesquinho e “babaca”, passando a fofo e nerd (na visão de Eleanor). O problema é que essa transição acaba ocorrendo na forma de saltos que parecem pontas soltas na história. Outra questão é quando o romance passa de algo menos idealizado para mais concreto, ocorre novamente esse baque. É como se as personalidades de Eleanor e de Park fossem ignoradas para a criação das cenas em que ocorrem contatos físicos mais intensos.

Em uma outra análise, incomoda também a passividade e inércia das personagens, em geral quanto às situações que são claramente inadequadas. Um exemplo é no que se refere aos momentos que Park mantém atitudes machistas, gordofóbicas ou quando sugere que a vítima seja a própria responsável pela situação provocada. Somado a isso há também a abordagem muito superficial e implícita de questões como a violência doméstica, tanto física, quanto verbal, e do racismo. Esses elementos são colocados como parte “natural” da sociedade e em momento algum é mostrado um posicionamento que os enfrente ou questione. Porém é importante lembrar que a história se passa na década de 80 e, apesar do questionamento sobre esses fatores ser essencial, talvez nessa análise estejam sendo levados em conta algumas discussões que provavelmente não teriam sido feitas de forma tão enfática como as que temos hoje em dia. Além disso, no que se trata do público-alvo, seria interessante que as críticas aos comportamentos como o bullying, racismo e gordofobia fossem rebatidos de forma mais ativa, estimulando uma percepção menos vulnerável dos leitores em relação a estas situações.

De forma geral, eu poderia atribuir os pontos positivos da obra a quando li o livro aos treze anos e os negativos à minha leitura mais recente. Porém, apesar de ter percebido os detalhes negativos apenas da última vez que o li, não posso dizer que não percebi detalhes positivos também ao longo dessa última experiência. Acredito que isso reforça bastante a ideia de que cada história é pensada para um determinado momento da trajetória de vida de uma pessoa e que, por mais que o “arranjo de palavras” seja o mesmo, o que se entende sobre elas depende muito da forma que cada um as internaliza e dá significado e isso está bastante relacionado à sua vivência.


AUTORA: Rainbow ROWELL
TRADUÇÃO: Lígia AZEVEDO
EDITORA: Seguinte
PUBLICAÇÃO: 2014
PÁGINAS: 360


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