E lá vamos nós para mais uma saga da Cassandra Clare que envolve o mundo dos caçadores de sombra e um enorme nepotismo de personagens já consagrados. CORRENTE DE OURO é o primeiro volume e acompanha os filhos de Tessa Grey e Will Herodale, protagonistas da saga ANJO MECÂNICO, vulgo “melhor coisa que a autora fez até agora”. A nova geração que inclui diversas famílias e intrigas falha logo no seu ponta pé inicial. Chega mais para entender melhor!

Antes de começar é interessante frisar que é até possível ler CORRENTE DE OURO sem ter lido nada antes, mas para quem acompanhou, pelo menos, os livros da saga ANJO MECÂNICO, as referências e personagens queridos fazendo uma ponta fazem a leitura ser muito mais interessante.

A trama, inicialmente, acompanha Cordelia, uma jovem que está chegando com sua família para a sociedade dos caçadores de sombras em Londres. Ela, que é de descendência persa, está lutando para defender seu pai, preso por ter cometido um possível equívoco numa missão que ceifou a vida de muitas pessoas. Sua família está fugindo desse escândalo e o objetivo maior da viagem é casar a jovem Cordelia com um rapaz importante, que venha a dar um status melhor para a garota e sua família. Em paralelo a isso, temos as desavenças dos filhos de Tessa e Will, que estão inquietos e escondem segredos. Um deles está se comunicando com um morto; e o outro tem uma espécie de poder que faz o mesmo conseguir acessar um mundo infernal. Ele como filho de uma feiticeira, quer saber quem é o seu avô, o demônio que ajudou a gerar Tessa, já que uma feiticeira é uma união entre um caçador de sombras e um demônio.

Depois dos eventos da saga ANJO MECÂNICO e a guerra que veio em sequência, a calmaria desceu sobre Londres, quase não se tem mais registros de ataque de demônios. Essa calmaria deixa a todos apreensivos, mas os jovens acabam ficando inquietos sem ação e o que resta para eles são festas e intrigas sentimentais. E o encontro de todas essas pequenas tramas, constroem a narrativa que, de longe, até agora, é a história mais bagunçada e desinteressante que a autora lançou.

Depois de ler absolutamente todos os livros da autora sobre os caçadores de sombras, uma fórmula acabou sendo desenvolvida. Aqui, ela é totalmente modificada, sendo substituída por uma nova que não ajuda a sua própria história. A falta de foco talvez seja o maior defeito do livro, que fica alternando de um personagem para o outro sem firmar os mesmos com precisão. A todo o momento somos bombardeados com novos personagens que são primos de alguém, irmãos de não sei quem, tios distantes. É muito difícil se apegar a todos, já que o livro não faz essa apresentação da melhor forma possível. Os principais até que são bacanas, como Cordelia, os filhos de Tessa, o irmão de Cordelia e só. Mesmo sendo um livro gigante, de quase seiscentas páginas, a narrativa se arrasta de mãos dadas a esse mar de personagens que querem destaque, todos ao mesmo tempo.

A falta de um ponto de vista central, como tínhamos em INSTRUMENTOS MORTAIS, PEÇAS INFERNAIS e ANJO MECÂNICO, mata a trama densa e pouco envolvente que é desenvolvida em seguida. Nem tem como falar um pouco sobre essa grande trama que liga todos esses arcos, ela até existe, mas é deixada de lado porque toda a hora alguém quer se aparecer com sua pequena trama, desde romances bobos como eu gosto dele e ele não gosta de mim, até mesmo outras que envolvem segredos do passado. O livro também se alterna em capítulos de flashback que são extremamente desinteressantes e que chegam para quebrar o já frágil ritmo da leitura.

As novidades que são realmente intrigantes ficam por conta de um coadjuvante, Alastair, o irmão da falsa protagonista Cordelia. Ele é um homem meio odiado por todos, porque segundo um deles, ele fez a vida de todos um inferno na época da escola de treinamento. Não fica muito claro se ele é um personagem tóxico ou não, mas o que fica claro é sua pequena trama que envolve aceitação e a rejeição de um grande amor, que só é ainda mais complicado quando ficamos sabendo que o personagem é LBGT. Imagina a situação difícil, a vida de um jovem gay na Londres antiga e conservadora. Essa trama de aceitação e inclusão cresce e envolve mais uma personagem, outra que aparece muito pouco, mas que tem grande potencial. Diferente de outras autoras que fingem a inclusão de minorias para as câmeras, Cassandra Clare sempre faz isso em seus livros e com muito cuidado e carinho. Muitos pontos para a autora nesse quesito.

No final não temos um grande embate, o que temos são pequenos conflitos que unem grande parte dos personagens. Tudo com bem menos intensidade se for comparado com outros inicios de saga que a autora já desenvolveu. CORRENTE DE OURO está longe de ser ruim, seu maior problema é a falta de cuidado durante a montagem dessa trama, pequenos ajustes fariam o livro estar no mesmo patamar de outros grandes sucessos da autora. Como um fã desse universo e da autora, consigo sentir um desgaste nas novidades desse universo. Os filhos de grandes personagens do passado nem sempre são garantia de sucesso e aqui nada joga a favor do livro, que é longo demais.

Mas isso não é o fim do mundo, já que esse é apenas o primeiro livro dessa nova saga, os próximos podem resolver todos esses problemas. Digo isso por experiência própria, já que, para mim, o primeiro livro da saga INSTRUMENTOS MORTAIS é extremamente ruim, mas com o tempo a autora soube dar um tratamento muito mais refinado para a trama, me fazendo em seguida ler tudo o que ela já escreveu e o que irá escrever.

CORRENTE DE OURO começa mal das pernas, mas termina com um gancho bem interessante para os próximos capítulos. Para quem é fã da saga e já chegou até aqui, a leitura é muito válida e não será ruim, graças à edição deslumbrante da editora Galera que além da capa metalizada lindíssima, ainda vem com um capítulo extra, uma espécie de conto que envolve personagens extremamente queridos. Uma edição super completa que vale uma conferida.


AUTORA: Cassandra CLARE
TRADUÇÃO: Mariana KOHNERT
EDITORA: Galera
PUBLICAÇÃO: 2020
PÁGINAS: 575


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