Com a chegada de LUCA, nova animação da Pixar, houve o reconhecimento da mensagem do filme ser direcionada contra o preconceito sofrido pelas pessoas LGBTQIA+. Logo surgiu a turma homofóbica indignada, afirmando que o filme não tem nenhuma mensagem nesse sentido, que é apenas uma animação sobre amizade. Vamos então conversar um pouco sobre aquilo que a obra entrega.

O filme começa com Luca sendo reprimido por sua família sobre o que existe fora da segurança do círculo familiar. Luca só estará seguro dentro das regras e dos limites que o pai e a mãe definem. Mas Luca se sente infeliz e incompleto, Luca sente que precisa conhecer o que existe além daquela vida controlada. E assim que Luca sai da água, ele se transforma em um novo ser, sente o gosto da verdadeira liberdade e felicidade. Da mesma forma que Luca, é assim que a maioria das pessoas se sentem quando conseguem “sair do armário”, quando vão contra as regras das chamadas “famílias tradicionais” e encontram coragem para enfrentar um mundo infinito na liberdade, mas também no preconceito.

Ato contínuo, no filme e na vida real, quando a família descobre que Luca subiu à superfície, os pais decidem mandá-lo para longe, para viver com um tio, em um local escuro e sem vida. Da mesma forma acontece com pessoas que descobrem suas identidades de gênero e sexualidade e são oprimidas pelas famílias, enviadas para locais onde acham que serão “curadas”, programas de recuperação, a “cura gay”, principalmente quando essas famílias são conservadoras religiosas.

Quando Luca sai para a superfície, ele conhece outro garoto igual a ele, Alberto, que foi abandonado e que vive sozinho, isolado em uma torre, tentando ser feliz do jeito que consegue. Quando tomam coragem para entrar na vila de pescadores, ambos se sentem muito diferentes das outras crianças e tentam fingir ser quem não são. Não existe uma enlace romântico entre eles, mesmo porque ser LGBT não é simplesmente uma questão de relacionamentos amorosos ou sexo. Muitos jovens LGBT se unem pela rejeição que sofrem pelos familiares e não por interesses românticos. O mesmo que Luca e Alberto.

Outra analogia é quando Alberto é descoberto pelos habitantes da vila, que o perseguem. Luca se afasta e deixa o amigo sozinho, com medo de também ser descoberto e perseguido. O mesmo acontece na vida real, quando muitas pessoas LGBT discriminam os iguais por medo de serem julgadas pela sociedade e sofrerem a mesma discriminação.

Mas Luca e Alberto não são os únicos personagens LGBT do filme. Na vila moram duas velhinhas que vivem juntas. Ao final da projeção, descobrimos que elas também são criaturas marinhas que se escondiam da sociedade e que, motivadas por Luca e Alberto, decidem se revelar como realmente são.

Até mesmo quando a terceira personagem principal do filme entra na trama, Giulia, uma garota, o que normalmente criaria um interesse romântico com Luca, isso não acontece. Luca não demonstra qualquer interesse por Giulia, não apenas porque o filme não é um romance, mas principalmente porque Luca não vê nada em Giulia que o atraia além da amizade. É por Alberto que Luca derrama lágrimas.

Luca termina se aceitando e perdendo o medo de julgamentos. Ele decide enfrentar o mundo, saindo da vila, rumando para uma vida de descobertas e oportunidades, sem esconder sua natureza. A frase dita por sua avó, quando ele vai embora, é cheia de significado para as pessoas que enfrentam a discriminação e o preconceito de serem como são, como todos os demais:

Algumas pessoas nunca vão aceitar ele, mas outras pessoas vão. E parece que ele sabe encontrar pessoas boas.

Existem outras frases cheias de significado e que confirmam a mensagem LGBT presente no filme:

Minha família ia me mandar para um lugar horrível, longe de tudo o que eu amo…
Se alguém fosse um monstro marinho, eu divido que sua escola o aceitaria.
O mundo é um lugar muito perigoso, e se eu precisar mandar você para o fundo do oceano para te manter seguro, que seja…
Os excluídos têm sempre que se ajudar.

LUCA é uma obra de arte, e como toda arte, ela pode ter diferentes significados para diferentes pessoas. Independentemente do diretor/roteirista/produtor afirmarem que a história não é um romance LGBT, fica óbvio que o resultado oferecido pela Pixar se encaixa perfeitamente na luta LGBT pela aceitação de igualdade e respeito. Tudo no filme remete à luta de milhões de pessoas perante uma sociedade homofóbica e preconceituosa, inclusive a escolha das cores dos personagens quando na forma marinha. E as mensagens de igualdade e aceitação são direcionadas amplamente para essas pessoas. O fato de muitos não reconhecerem a mensagem, só comprova como os “monstros marinhos” ainda terão que lutar muito para serem aceitos.

Ah, e se você ainda não leu a crítica do filme, só clicar aqui.